Sociólogo marxista debate democracia e lutas populares na CUT

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Promovido pela Frente Brasil Popular e pelo MST, debate sobre democracia e lutas populares na América Latina lotou o auditório Adelino Cassis, localizado na CUT Brasília, na noite da última quinta-feira (28). A atividade contou com a participação do sociólogo e filósofo belga François Houtart, um dos idealizadores do Fórum Social Mundial, além de padre adepto da teologia da libertação. O debate também contou com a presença do coordenador nacional do MST, Alexandre Conceição e de outros movimentos comprometidos com a democracia, como Levante Popular da Juventude, Marcha Mundial de Mulheres, Movimento dos Povos da Colômbia e Movimentos Contra Mineração e Barragens.

Para o coordenador nacional do MST, esses momentos de diálogo e integração são muito importantes para iluminar a batalha que está por vir. “Uma batalha de rua, no latifúndio, do movimento sindical e contra esse golpe de estado que está tramitando agora no Senado Federal com o processo de impeachment da presidenta Dilma, uma mulher honesta que está sendo condenada por uma corja de ladrões. Mas essa não é apenas uma batalha que vamos ganhar nas ruas, precisamos avançar sempre e cada vez mais no campo das ideias e ideologias para derrotar os golpistas e construir uma América Latina livre e unificada. Tenho a plena certeza de que mais cedo ou mais tarde a vitória será do povo brasileiro”, discursou Alexandre Conceição.

Apesar da crise politica e econômica com a qual convive a América Latina, François Houtart acredita que somos o único continente que conseguiu ter experiências pós-neoliberais, no sentido de tentar reconstruir o papel do Estado e suas funções sociais. “Outros continentes, como a Europa, possuem crises com o neoliberalismo e acabam implementando medidas ainda mais neoliberais. A América Latina, graças a uma conjuntura econômica favorável nos preços de matéria prima que encontrou nos últimos 15 anos, pode fazer o resgate do Estado e implementar políticas de distribuição de renda e reorganização dos serviços públicos. Agora, estamos em frente a uma nova crise muito forte, que não é somente econômica mas alimentícia, energética, política, climática e todas elas têm como plano de fundo a lógica do sistema capitalista, que é a concentração da riqueza em uma pequena parte da população”, afirma o sociólogo.

Para François Houtart, vivemos um período de esgotamento da experiência pós-neoliberal, que não acontece somente no Brasil mas em todos os outros países também. O sociólogo acredita que é necessária a criação de uma nova política econômica e critica a alternância de poder e as alianças entre governos progressistas e setores de direita da sociedade. “Não podemos regressar aos projetos neoliberais; o capitalismo nunca vai se preocupar com a saúde da terra e da classe trabalhadora”, explica Houtart.

“A luta contra a pobreza foi real, milhões de pessoas saíram da miséria e isso é muito importante. Também houve uma melhoria no acesso serviços públicos como saúde e educação e finalmente distribuição relativa. Assim foi possível beneficiar os pobres sem tocar muito na riqueza dos ricos. Houve grandes esforços -grande parte por Hugo Chavez especialmente – para promover a integração América Latina, mas, com algumas poucas exceções, o campo da comunicação social continua sendo controlado pelo grande capital e pelo imperialismo norte americano. Nenhum país conseguiu fazer de fato a reforma agrária, ou seja, muita coisa mudou, mas as reformas que eram estruturais não foram realizadas”, critica François Houtart, que acredita também que a classe média (que praticamente dobrou no país) é construída pela possibilidade de consumo, e especialmente no Brasil, essa parcela da população adquire bens e serviços que não são produzidos no país, aumentando ainda mais a dificuldade de equilibrar a balança social”, afirma François Houtart.

Construção de um novo caminho

Um dos idealizadores do Fórum Social Mundial, François Houtart acredita que a existência do Imperialismo norte-americano é um dos fatores que contribuem para a constante desestabilização dos governos progressistas na América Latina e pela continuidade da predominância do sistema _MG_0939capitalista mundial. “Porém, também devemos considerar a força do capitalismo de monopólio mundial e grandes empresas multinacionais, que criam novas dependências do capital internacional também. Temos dificuldade de exercer políticas monetárias com dominação do dólar. Em contrapartida, a direita aproveita-se de toda essa situação e trata de recuperar seu poder por meio dos governos de aliança, que não bastam para eles e por isso eles tentam de todas as formas recuperar a totalidade do poder político”, explica Houtart.

Para o sociólogo e filósofo belga, precisamos criar um novo paradigma político, fruto de um trabalho em conjunto que aplique de forma concreta as relações com a natureza e toda vida física, cultural, e espiritual por meio de processos democráticos na política, na economia e na construção de uma interculturalidade, que valorize as diferenças ao invés de continuar destacando a cultura ocidental como se fosse a única e marginalizando todas as demais. François Houtart afirma ainda que o Fórum Social Mundial é um mecanismo importante porque reúne milhares de movimentos, mas que os mesmos não são bastante articulados para ter força política e poder para mudar a realidade.

“Penso que o trabalho que devemos fazer dentro e depois da crise é concentrar-nos sobre uma visão nova, a criação novo paradigma contrário às imposições do capitalismo. Todo o momento que vivemos hoje me parece uma oportunidade para protagonizarmos um novo tempo”, explica o sociólogo.

Para Houtart, os movimentos sociais podem construir uma nova orientação política na América Latina. “O capitalismo é cínico e para criar uma nova situação de transformação social, é indispensável um processo de luta contínua. Não vai ser fácil, mas nós temos a capacidade de alterar tudo isso”, conclui Houtart.

Fonte: CUT Brasília