O princípio da estabilidade financeira do empregado

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Nas relações contratuais de trabalho, existem situações em que o empregado é chamado a ocupar na empresa uma função diversa do seu cargo efetivo, recebendo uma gratificação por essa nova atribuição, ciente de que poderá ser dispensado da função gratificada a qualquer tempo, revertendo ao cargo efetivo.

A CLT prevê essa possibilidade nos artigos 450 e 468, assegurando ao empregado a volta ao cargo anterior e a contagem do tempo de serviço e garantindo ao empregador o direito de nomear e de dispensar da função a qualquer tempo, sendo certo que em geral o empregado, ao reverter, perde a gratificação, reduzindo-se o patamar remuneratório.

Contudo, se o empregado contava 10 anos ou mais percebendo a gratificação e se a dispensa se deu sem justo motivo, pelo princípio da estabilidade financeira, materializado na Súmula nº 372 do Tribunal Superior do Trabalho, o empregado tem direito à incorporação da gratificação. Confira-se o teor da Súmula:
GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO.
SUPRESSÃO OU REDUÇÃO.
LIMITES (conversão das Orientações Jurisprudenciais n° 45 e 303 da SBDI-1) – Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005

I – Percebida a gratificação de função por dez ou mais anos pelo empregado, se o empregador, sem justo motivo, revertê-lo a seu cargo efetivo, não poderá retirar-lhe a gratificação tendo em vista o princípio da estabilidade financeira. (ex-OJ nº 45 da SBDI-1 – inserida em 25.11.1996)

II – omissis

A Súmula representa a uniformização do entendimento do TST, estando solidamente fundamentada nos princípios da irredutibilidade salarial (art. 7º VI, da Constituição), da proibição das alterações contratuais lesivas (CLT, art. 468) e da natureza salarial da gratificação de função (art. 457, § 1º).

Assim, o empregado que serviu seu empregador por longos 10 anos, tendo dimensionado o seu orçamento contando com a gratificação, é justo que conserve o padrão remuneratório (que nada fez para perder) daí por que o empregador “não poderá retirar-lhe a gratificação”.

O empregado que durante 10 anos desempenhou a mesma função comissionada e, portanto, auferiu a mesma gratificação, se encaixa perfeitamente na Súmula: dispensado do cargo, incorpora integralmente a gratificação, que pelo decurso do tempo se incrustrou na remuneração, tornando-se a retribuição mínima devida àquele empregado.

Contudo, existem situações em que o empregado percebia gratificação de função por 10 anos ou mais, sendo, porém, várias as funções e distintos os valores (comum nos empregos públicos), de sorte que a simples incorporação da última não representaria uma reparação justa (por exemplo, se a última gratificação era justamente a menor).

Em casos assim, por equidade, para que prevaleça o justo e o razoável, deve ser incorporado o valor médio das gratificações pagas nos 10 anos, critério que já foi adotado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, que entendeu, sendo distintas gratificações durante o decênio, ser devida a incorporação pela média dos últimos 10 anos, conforme verbete nº 12/2004

VERBETE Nº 12/2004

GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO EXERCIDAS POR MAIS DE 10 (DEZ) ANOS. APLICAÇÃO DA ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL Nº 45, DA SBDI1, DO COL. TST. FORMA DE CÁLCULO.

Ainda que o empregado receba distintas gratificações durante o decênio de que trata a OJ 45, da SBDI-1/TST, esta será aplicável, devendo ser integrado à remuneração do trabalhador o valor médio das gratificações recebidas nos últimos 10 anos, observado para fins de cálculo o importe relativo a cada uma delas, ou equivalente, na data da supressão.

O princípio da estabilidade financeira do empregado merece todo zelo da ordem jurídica, tendo em vista que transcende a pessoa do trabalhador individualmente considerado, para assegurar a estabilidade da família, ao preservar o padrão de vida do grupo familiar, que se estruturou contando com os ganhos regulares auferidos por 10 anos ou mais.

Paulo Roberto Alves
da Silva é sócio da LBS Advogados Associados, que presta assessoria jurídica ao Sindicato.