Juros nas alturas inviabilizam produção industrial, aponta painel

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São Paulo – O secretário-geral da CUT, Sérgio Nobre, defendeu nesta sexta-feira (31), que a produção industrial brasileira precisa crescer. O diagnóstico foi feito durante o painel Estrutura do Sistema Financeiro Nacional, dentro da programação da 17ª Conferência Nacional dos Bancários, que acontece em São Paulo até  domingo (2) e vai definir a pauta nacional da categoria para a Campanha 2015.

“Há 30 anos, a participação da indústria no PIB (Produto Interno Bruto) era de 30% e hoje representa 10%. Isso é grave, porque a produção tem relação direta com o padrão de vida dos trabalhadores e com o tipo de país que queremos”, apontou o dirigente sindical.

Por outro lado, acrescentou, o comércio experimentou um crescimento “extraordinário”, resultado do aumento real de salário e da instituição de uma política de concessão de crédito, a partir de 2003. “Acontece que a produção industrial brasileira não acompanhou o crescimento do consumo, abastecido por produtos importados, por causa do neoliberalismo. O ideal seria que produção e consumo andassem juntos”.

Contudo, segundo Nobre, essa curva ascendente do comércio vem se invertendo nos últimos tempos por conta do aumento sistemático da taxa básica de juros, o que está levando o país à recessão. “Quanto maior a taxa de juros, menos dinheiro para investimentos. Isso desestimula a produção e o consumo, porque torna caro o financiamento e o produto final”.

A solução? Para o palestrante, há dificuldades estruturais para reverter esse quadro, dado o perfil do setor industrial. Em sua grande maioria (98%), a indústria nacional é composta por micro e pequenas empresas, que não contam com uma política direcionada de financiamento, ao contrário das grandes corporações, embora estas empreguem 30% da mão de obra do país e aquelas, cerca da metade.

Bancos destoam

No caso dos bancos, o cenário se mostra destoante, apontou o secretário-geral da CUT. Mesmo com a economia apresentando sinais de recessão, o setor tem auferido lucros extraordinários, realidade que contribuiria, conforme explicou, na promoção do desenvolvimento industrial, mas não tem interesse, porque tem como foco a especulação e não está preocupado com o desenvolvimento do país. “Pelo contrário, as instituições financeiras seguem demitindo”.  

O secretário-geral da CUT defendeu a integração entre setores econômicos, com a realização de uma conferência, convocada pelos trabalhadores do sistema financeiro, que reúna representantes de outras categorias com o objetivo de criar propostas para mudar o sistema financeiro. Para ele, é fundamental a participação dos trabalhadores no Conselho Monetário Nacional (CMN), que define a política de juros do Brasil. “Se as taxas de juros estivessem em níveis internacionais, seriam gerados cerca de três milhões de empregos”.

Desigualdades de renda

Em sua exposição no mesmo painel, o economista e professor da Unicamp Fernando Nogueira da Costa destacou como a política de juros impacta na desigualdade social.

“No mundo, os 85 mais ricos concentram riqueza equivalente à de metade da população”, enfatizou ele. Os números são alarmantes: “numa população de 7 bilhões de pessoas, 20% vivem com menos de um dólar por dia. É um problema no mundo todo, não só do Brasil”.

A raiz do problema, que leva à desigualdade, argumentou ele, está na diferença entre a renda do capital e do trabalho. Como exemplo, ele citou: “nos últimos anos, no Brasil, o crescimento do salário médio real foi de 17% e o do capital, 130%”. Apesar disso, ponderou ele, muito se avançou. “Nos anos 90, éramos o segundo país com pior distribuição de renda em todo o mundo. Hoje, somos o 12º”.

Ele disse que a taxação da riqueza como uma possível solução para diminuir a desigualdade de renda passaria necessariamente por uma política que fosse adotada em todos os países, desenvolvidos e em desenvolvimento, para se evitar a fuga de capital.

Precarização

Já o presidente da Conferência Nacional dos Trabalhadores no Comércio e Serviços (Contracs-CUT), Alci Matos Araújo, falou dos impactos da introdução e da ampliação dos serviços bancários no comércio.

Esse avanço, segundo ele, é uma tentativa das instituições financeiras de ampliar seus os lucros às custas de redução de investimentos. “Os bancos têm buscado, cada vez mais, o comércio e seus serviços agregados para atuarem como correspondentes bancários, transformando, via processo de terceirização, lojas e supermercados em vendedores de produtos financeiros, agentes e promotores de crédito”.  

Isso se traduz em precarização para a categoria, segundo Araújo. Na questão da jornada, por exemplo, os bancários têm garantida na Convenção Coletiva de Trabalho jornada de trabalho de 6 horas, com piso salarial de R$ 1.638,62, enquanto os comerciários fazem negociação individual, com piso médio de R$ 870 para uma carga horária de 44 horas semanais.

Como estratégia de luta, Alci Matos conclamou bancários e comerciários a se unirem. “A unidade de categorias do sistema financeiro e do comércio para fortalecer a ação sindical e avançar nas conquistas é fundamental”.   

Renato Alves
Do Seeb Brasília