Fundos conservadores perdem 100 mil investidores em 2009

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Queda da Selic provoca saída de aplicações populares, que encolheram R$ 1,6 bilhão até o dia 21 de julho

Agência Estado – Luís Eduardo Leal

Neste ano (até o dia 21 de julho), a redução da taxa Selic provocou uma perda de cerca de 100 mil investidores em fundos de varejo com aplicação inicial de até R$ 5 mil, conforme levantamento do site financeiro Fortuna (www.fortuna.com.br). No mesmo período, o patrimônio líquido desses fundos encolheu R$ 1,6 bilhão. Mas, apesar do desempenho negativo no ano, essas aplicações populares ainda reúnem 1,8 milhão de cotistas, com aplicação média de R$ 18 mil – e R$ 33,5 bilhões em ativos totais. A perspectiva é de que, com a Selic em queda, essa fatia dos investidores continue a ser atraída para a poupança. Com retorno superior ao de muitos fundos, a caderneta vem ampliando sua captação líquida.
“Devemos ver ainda no segundo semestre uma migração mais forte de recursos dos fundos para a caderneta de poupança. E o governo será forçado a agir, até pela necessidade de manter o financiamento da dívida pública”, avalia o coordenador da área macroeconômica da Tendências Consultoria Integrada, Juan Jensen. “Corrigir o Imposto de Renda incidente sobre fundos ou estabelecer tributação para a poupança são medidas paliativas. A solução de longo prazo é mexer nos critérios de correção da poupança”, acrescenta.
De acordo com a Tendências, considerando a Selic de 8,75% ao ano e um prazo de aplicação de dois anos, mesmo fundos conservadores com taxa de administração de 0,5% perderiam da poupança nesse horizonte de tempo, em que é cobrada a menor alíquota de IR (15%). “A migração ainda não ocorreu com força até por falta de informação. Mas, se o governo não fizer nada, vai se intensificar nos próximos meses”, diz Jensen.
Bancos fazem ajustes
Com a taxa Selic reduzida na semana passada pelo Banco Central para 8,75% ao ano, e mais de dois meses depois de o governo prometer apresentar um projeto de lei para estabelecer tributação de Imposto de Renda sobre os rendimentos de depósitos acima de R$ 50 mil na poupança a partir do próximo ano, a ameaça de êxodo de pequenos investidores dos fundos conservadores em direção à caderneta ainda não abalou a confiança dos bancos. As instituições, pressionadas pela baixa da Selic e pela poupança mais competitiva, em certos casos ampliaram a captação de recursos nos últimos meses, com ajustes nas taxas de administração e no valor mínimo exigido para a aplicação inicial.
No Santander, cerca de 70% das captações realizadas neste ano pelos fundos de varejo foram feitas pelos de renda fixa, favorecidos pela possibilidade de prefixação da taxa de juros em um contexto de queda da Selic e pela presença nas carteiras de títulos de crédito privado, como debêntures, que pagam prêmios de risco acima do CDI. “A migração para a poupança ainda está muito tímida. Se olharmos os últimos 12 ou 18 meses, houve alguma saída, mas que não se acelerou recentemente – ao contrário do que se previa”, diz o estrategista de investimentos pessoais do Santander Asset Management, Aquiles Mosca.
O HSBC registrou alta de 20% na captação líquida dos fundos conservadores e de multimercados que tiveram suas premissas de custo e valor mínimo de aplicação alteradas nos meses de janeiro e abril, em resposta a cortes da Selic. “Os estudos estão sendo finalizados para que, no início de agosto, possamos anunciar uma nova rodada de ajustes”, diz a gerente de produtos da HSBC Global Asset Management, Valéria Fontes, acrescentando que, desta vez, devem ser focados os fundos que ainda conservam taxas de administração no patamar mais elevado, entre 3% e 4% ao ano. Nesse grupo estão, principalmente, os fundos de curto prazo que, cada vez mais, são percebidos pelos investidores como uma espécie de conta remunerada.
“Sem a CPMF, o investidor aceita uma remuneração menor para esse dinheiro de curto prazo, ainda que o IR e as taxas de administração absorvam parte da rentabilidade”, diz o diretor-executivo de produtos de investimentos e previdência do Itaú Unibanco, Osvaldo do Nascimento, observando que a caderneta não oferece liquidez diária. “Existe uma ineficiência de cerca de 30% nas aplicações em poupança – porcentual que corresponde a saques antes da data de aniversário e que, dessa forma, ficam sem remuneração”, acrescenta o executivo.
“Os fundos e a poupança continuarão a conviver, como sempre aconteceu. Mesmo quando a poupança tinha rentabilidade inferior à dos fundos, a caderneta não desapareceu. São públicos distintos”, afirma o gerente-geral de varejo do Banco do Brasil, Antonio Cássio Segura, acrescentando que 95% dos poupadores da caderneta respondem por apenas 5% do volume financeiro. “A poupança é uma tradição entre quem tem até R$ 500 por mês para economizar. Os fundos, por outro lado, oferecem a conveniência da liquidez diária. E muitos investidores, inclusive os pequenos, se dispõem a trocar parte da rentabilidade pela comodidade de sacar a qualquer momento.”
Aplicações mais arriscadas
Os bancos acreditam que, diante do menor potencial de retorno oferecido pelas aplicações conservadoras, o caminho natural para o investidor será assumir mais risco – a aposta é no fortalecimento dessa prateleira. “Entre os investidores com maior disponibilidade de recursos, já notamos um movimento em direção aos multimercados, que deverá ser seguido, em parte, pelos pequenos”, diz Valéria, do HSBC, que considera que a poupança atrairá apenas os aplicadores mais conservadores. O Banco do Brasil, por sua vez, mantém 20 fundos de ações abertos a aplicações iniciais de R$ 200 e reduziu a taxa de administração média dos fundos de varejo (aí incluídos os conservadores) para 1,38% ao ano.
Para Nascimento, do Itaú Unibanco, cada vez mais o investidor precisará entender a importância de estabelecer horizontes de tempo distintos para suas aplicações. “Antes, com taxa de juros muito elevada, era só colocar o dinheiro no DI. Agora, com a Selic em queda, não faz sentido raciocinar apenas em rentabilidade baseada em juros. É preciso olhar para a composição do portfólio – e diversificar em função do prazo de retorno.”
De olho nessa fatia do público que deve buscar exposição maior à renda variável nos próximos meses, mas que ainda não se acostumou totalmente aos altos e baixos da Bolsa, o Itaú Unibanco tem apostado na oferta de fundos de capital protegido – aqueles em que a aplicação principal é assegurada pela instituição. “Já lançamos quatro fundos, com os quais captamos R$ 800 milhões. O próximo estará aberto para aplicações ao longo do mês de agosto.”
O Santander também acredita no crescimento da opção por capital protegido nos próximos meses, e tem procurado inovar no segmento. Nesta semana, o Real, instituição vinculada ao Santander, lançou um fundo com prazo de 18 meses que assegura ao investidor o direito de sacar os recursos (marcados a mercado) ao final de cada trimestre, se desejar – normalmente, os fundos de capital protegido são fechados a saques por todo o prazo da aplicação.
“Percebemos que há investidores que desejam se arriscar, mas que se machucaram na crise. O caminho para a indústria de fundos é agregar valor aos produtos”, diz Mosca, acrescentando que os investidores não se incomodam de pagar taxas de administração maiores se percebem que a rentabilidade alcançada pelo gestor e o formato do fundo fazem a diferença. “Lançamos então um capital protegido diferente, em que caso a Bolsa caia até 20%, o investidor recebe a remuneração inversa ao porcentual de queda. Caso a Bolsa suba, o investidor fica com a valorização integral se o índice subir até 40%”, explica o estrategista.
Opções em fundos conservadores
Nos produtos tradicionais, o Itaú Unibanco flexibilizou as taxas de administração dos fundos DI e de renda fixa em função do total de recursos aplicados pelo investidor na instituição – o que inclui, também, os fundos de previdência. “Um cliente do Itaú Personnalité que tenha R$ 50 mil em diferentes aplicações passa a pagar 1% de taxa de administração num fundo de renda fixa ou DI, independentemente do valor que decida aplicar nesse fundo. No caso de um cliente de varejo, 1,4% para o mesmo valor depositado no banco”, explica Nascimento.
Sem que o governo decida mexer na fórmula de correção da caderneta de poupança, que hoje assegura remuneração de cerca de 6% ao ano mais TR, o piso de juros está dado. “No financiamento imobiliário, por exemplo, não dá para ir além de 8% ao ano mais TR, se a poupança capta a 6% mais a taxa referencial”, observa Nascimento. Quando a proposta de tributação da poupança foi anunciada pelo Ministério da Fazenda, no dia 13 de maio, a Selic estava em 10,16% – no dia 24, estava em 8,66%, dois dias depois de o Comitê de Política Monetária (Copom) ter reduzido a meta da taxa básica de juros para 8,75% ao ano. Com o atual ciclo de cortes da Selic, a taxa básica de juros está cinco pontos porcentuais abaixo dos 13,75% de dezembro de 2008. (colaborou Rita Tavares)