
De acordo com o filósofo revolucionário alemão Karl Marx, o capitalismo sabe se reinventar. Demonstrando a veracidade da citação, o desembargador do trabalho, Grijalbo Fernandes Coutinho, realizou a palestra “Terceirização – máquina de moer gente trabalhadora”, homônimo de seu livro, nesta terça-feira (14), no auditório Adelino Cassis da CUT Brasília. Ele mostrou que subcontratação ilimitada e irrestrita da mão de obra em todos os setores de produção e serviço, objetivo-fim do projeto de lei 4330, contempla a nova roupagem do capitalismo selvagem.
Com o auditório lotado de dirigentes e militantes sindicais e sociais, parlamentares e a sociedade civil, Grijalbo afirmou que o PL 4330 é uma alternativa de os empresários continuarem o processo de acumulação de riqueza sem distribuição de renda.
O desembargador fez uma contextualização histórica, lembrando que o modelo de terceirização foi fortalecido após a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945), no Japão, quando o país adotou a subcontratação, a produção terceirizada e vinculada à demanda, com público seletivo e fragmentação sindical, temas que caracterizam o processo conhecido como toyotismo (substituto do fordismo). O objetivo era lucrar a partir da mão de obra, com um novo arranjo de trabalho, já que as primeiras ações que alavancaram o capitalismo comercial foram freadas para estabilizar o mercado financeiro, diante da superacumulação de riquezas não distribuídas, iniciada ainda na Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918).
Como mostra o livro de Grijalbo Coutinho, a introdução forte desse modelo de produção capitalista no Brasil teve início nos anos 80, se consolidando nos anos 90. Inerente ao processo, o ataque da terceirização da mão de obra causou feridas profundas nas relações de trabalho brasileiras devido à própria configuração do sistema econômico do país.
“No Brasil, temos um problema de formação da nossa economia, que tem resquícios fortíssimos do nosso passado colonial escravista. Jamais rompemos com essa mácula. Na transição do capitalismo comercial para o industrial, no final do século XIX e início do século XX, nós não conseguimos fazer uma revolução burguesa no Brasil. Aqui foi um conchavo das elites rurais, a nova elite industrial e os setores internacionais”, explica o desembargador Grijalbo Coutinho.
Segundo o pesquisador do tema terceirização, o PL 4330 “não resolve, mas aprofunda os problemas de relações de trabalho”. Ele explica que, do ponto de vista econômico, o projeto visa à redução do custo na mão de obra a partir do aumento na jornada de trabalho, redução de salários e a eliminação de uma política preventiva prévia de acidentes do trabalho. Do ponto de vista político, a terceirização ilimitada fragmenta a organização sindical e enfraquece as chances de negociação dos trabalhadores com os patrões. “Este fenômeno perverso não pode ser legitimizado”, diz.
Escravidão e morte legalizadas
O livro “Terceirização – máquina de moer gente trabalhadora” apresenta dados que comprovam a ligação direta entre terceirização e escravidão. “Mais de 90% dos casos análogos de trabalho escravo no Brasil estão associados à terceirização”, afirma o desembargador Grijalbo Coutinho.
Ele ainda conclui que a terceirização “mata e mutila os trabalhadores”. “De 2003 a 2011, dos 63 trabalhadores da Cemig (companhia de energia elétrica de Minas Gerais) vítimas de acidente fatal, 54 eram terceirizados. No sistema petroleiro, de 1995 a 2003, o número de acidentes fatais entre trabalhadores terceirizados e os contratados diretamente foi 7,23% maior para os subcontratados. Na construção civil, durante a construção dos estádios que receberam a Copa do Mundo de 2014, dos 12 trabalhadores mortos, 11 eram terceirizados”, mostra.
Para Grijalbo, o PL 4.330 vai agravar, inevitavelmente, o cenário problemático quanto à segurança no trabalho, gerando ainda mais mortes e mutilações.
Menos garantias
Segundo a presidente da Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas do DF – Abrat, Alessandra Camarano Martins, o PL 4330 “não traz nenhum benefício jurídico aos trabalhadores”. “Muito pelo contrário, é um projeto que prejudica inclusive a mobilização sindical desses trabalhadores e a fiscalização que os sindicatos podem fazer nas empresas e ambientes de trabalho; não garante benefícios, não aumenta empregabilidade, mas reduz o emprego”, afirma. Ela também participou da palestra sobre terceirização, realizada na CUT Brasília, nesta segunda-feira (14).
A advogada ainda diz que a terceirização representa “precarização das relações de trabalho, discriminação da classe terceirizada, que ganha salário inferir, não têm garantia de extensão de benefícios e de direitos previstos em normas coletivas de trabalho; a tendência das empresas terceirizadas é se afastarem do mercado de trabalho e deixarem a conta nas costas do trabalhador”.
Classe mobilizada para o dia 15
Os trabalhadores e trabalhadoras, brutalmente hostilizados pela polícia militar e legislativa no dia 7 de abril por protestarem em frente ao Congresso contra a aprovação do PL 4.330, não recuaram. Apesar de o plenário da Câmara ter aprovado o mérito do projeto por 324 votos favoráveis a 137 contrários, a classe trabalhadora organizada pela CUT e outras centrais sindicais está mobilizada para barrar o projeto da escravidão no Senado.
“Desde o início dessa semana, estamos realizando diversas atividades para pressionar o Senado e não deixar que o PL 4.330 avance. Nesta quarta-feira, dia 15, Brasília irá se integrar ao Dia Nacional de Paralisação, e vamos mostrar que a classe trabalhadora não vai admitir retrocesso”, afirma o presidente da CUT Brasília, Rodrigo Britto.
A secretária de Relações do Trabalho da CUT Nacional, Graça Costa, que participou da atividade da CUT Brasília nesta terça-feira (14), reforçou a convocação para o Dia Nacional de Paralisação. “O Brasil inteiro está se preparando para o dia 15. Vamos unir e mostrar a força de mobilização da classe trabalhadora. Não vamos permitir retrocesso. Não ao PL 4.330”, discursa.
Mulheres na mira da precarização
A deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) integrou a mesa sobre “Terceirização – máquina de moer gente trabalhadora” e repudiou veementemente a proibição da entrada de trabalhadores e trabalhadoras à Câmara dos Deputados no último dia 7, e o uso de força policial contra os manifestantes, a mando do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Além da ação arbitrária de Cunha, a parlamentar também reafirmou sua posição contrária ao projeto de lei 4330.
Segundo Rosário, as mulheres serão as maiores prejudicadas pelo PL 4330. “As mulheres têm salários menores que o dos homens em até 20%, trabalham três horas a mais e estão majoritariamente nas categorias mais desvalorizadas. Por isso, com o PL 4330, que precariza ainda mais as relações de trabalho, as mulheres são as principais vítimas”, afirma.
A deputada gaúcha ainda apresentou aos participantes da atividade da CUT Brasília o Projeto de Resolução 30. O objetivo da proposta é impedir que o presidente da Câmara dos Deputados tente proibir o acesso da população, a maior interessada nas questões tratadas na Casa, às galerias para acompanhar votações de projetos. A apresentação do texto na Câmara deverá ser feita nesta terça-feira (14).
Além de Maria do Rosário, estiveram presentes à palestra o deputado federal Roberto Policarpo (PT-DF) e o deputado Distrital Chico Vigilante (PT-DF), fundador e primeiro presidente da CUT Brasília.
Fonte: CUT Brasília
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