

A Comissão da Verdade sobre a Escravidão no Distrito Federal e Entorno, do Sindicato dos Bancários de Brasília, vem a público declarar veemente seu repúdio às atuações do Governo Federal na recém-iniciada gestão Michel Temer, resultante de ilicitude sobre a democracia brasileira. É com grande indignação que se une à maior parcela da população para dar visibilidade às decisões que infringem sobre a representatividade e os direitos fundamentais de mulheres, segmentos das populações negra e indígena,de jovens em vulnerabilidade social, entre outros, todos vítimas de um ataque às suas conquistas sociais, políticas e econômicas duramente alcançadas em séculos de história, a fim de beneficiar uma minoria elitista.
É inaceitável que em menos de uma semana de governo tanto se tenha perdido no que diz respeito aos avanços adquiridos em nome da paridade, deixando óbvio que na filosofia do poder vigente o capitalismo está acima da vida e dos direitos humanos. Prova disso está, por exemplo, na entrega de poderes específicos a partidos expressamente declarados inimigos de minorias em avançados graus de vulnerabilidade, proporcionando guerras injustas sem possibilidades de conciliação e desenvolvimentos mútuos.
O Brasil ratificou a Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre a Discriminação em Matéria de Emprego e Profissão, em Genebra, no ano de 1958; a Convenção de 1960 da UNESCO, relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino; a Convenção Geral das Nações Unidas para a Eliminação de todas as Formas de Racismo, em 1966; a Convenção 169 da OIT, de 1989, sobre os direitos fundamentais dos povos indígenas e tribais dentre os quais incluem-se as comunidades remanescentes de quilombos; assim como participou ativamente da condenação do Apartheid sul-africano nos fóruns internacionais e nas duas primeiras conferências mundiais contra o racismo.
Embora nunca se tenha consolidado um regime com este perfil do ponto de vista legal e formal no Brasil, as distinções e desigualdades raciais são contundentes, facilmente visíveis e de graves consequências para a população negra e para o país como um todo, ratificando um apartheid social.
Diante desse cenário, assistimos atônitos à extinção do Ministério da Cultura (MinC), que tinha entre suas competências garantir o reconhecimento da identidade nacional, preservar patrimônios do país, fomentar a chamada “economia da Cultura”, importante fator ao desenvolvimento econômico autossustentável de comunidades tradicionais. Acrescente-se ainda a extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos, oficializada no dia 12 de maio, véspera da data em que, em 1888, ocorreu a Abolição da Escravidão no Brasil e que atualmente é símbolo de luta pela ressignificação da escravatura segundo suas vítimas e fontes silenciadas ao longo da História.
É fato que os negros vivem num ambiente declaradamente hostil que nega a sua cor, sua identidade e sua humanidade. Além das mortes físicas, a população negra ainda tem que conviver com as mortes simbólicas que ocorrem diariamente, pois o Racismo Institucional fecha portas aos negros na saúde, na educação, na segurança pública e mercado de trabalho, principalmente nos espaços políticos onde deveriam exercer sua representatividade em relação às suas demandas. Tal obstáculo não coloca em risco apenas a sua dignidade, mas também a sua autoestima e a saúde física e psíquica.
É por todos esses e outros motivos que uma Comissão criada especificamente para resgatar e visibilizar perdas históricas não admite atuações que tenham como sinônimo o retrocesso na efetivação da igualdade de oportunidades, na defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e no combate ao racismo e às demais formas de intolerância.
A extinção dessas instâncias governamentais e a predominância de gestores brancos, de sexo masculino e vinculados a partidos com históricos machistas, homofóbicos, racistas, não nos representa. Só demonstra cada vez mais que, apesar de avanços significativos na política de promoção da igualdade racial, o país ainda não logrou acabar com a discriminação e nem conseguiu propiciar igualdade de direitos. A população negra assiste consternada à inclusão dessa temática em um saco denominado “minorias”, o que demonstra, mais uma vez, o descaso do Estado Brasileiro.
A liberdade e a igualdade de direitos da população negra ainda são utópicas, pois permanecem nos piores postos de trabalho, nas periferias das grandes cidades, na indigência e pobreza. Cabe ainda lembrar o genocídio da população negra, em especial de jovens assassinados maciçamente nos bairros periféricos.
Esta Comissão representa negras e negros remanescentes de um processo de exclusão secular e é enquanto negras e negros que não admitimos perder nosso referencial e nossa proteção constitucional. Não queremos mais, não aceitamos menos. Queremos Justiça! Queremos pessoas que de fato sejam a nossa voz. Um país só cresce se todos os seus habitantes crescem juntos e nós, negras e negros, somos 53% da população do Brasil.
Brasília, 16 de maio de 2016.
Comissão da Verdade sobre a Escravidão no Distrito Federal e Entorno
Sindicato dos Bancários de Brasília
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