Os ataques aos funcionários do BB iniciados pelo governo de Fernando Henrique Cardoso logo após sua posse, em 1º de janeiro de 1995, foram retomados em 2019 e nunca cessaram. O objetivo tem sido fragilizar o banco, equiparando suas práticas comerciais e trabalhistas ao pior do “mercado”, para que tenham argumentos para se manter na direção do banco e, efetivamente, entregar ao mercado financeiro o controle da maior instituição financeira do país.
A gestão atual do BB, mais uma vez, utiliza-se da falácia da “modernização” para justificar seus ataques aos direitos da categoria. Entre outras medidas, tenta impor a jornada de 8 horas, uma velha tática que sempre foi derrotada, como ocorreu na lendária nomeação de Caixas Executivos de 8h, que gerou a famosa “habitualidade”. Os derrotados passaram, então, a perseguir os caixas, criando uma divisão interna entre o funcionalismo do BB.
A direção do Sindicato dos Bancários de Brasília entende ser importante resgatar a história para fortalecer a mobilização, criar consciência e estimular a luta coletiva em defesa da categoria e da instituição.
Elegível, excedente e exilado: um assédio criminoso
Para retratar essa história, conversamos com o nordestino Luís da Silva (nome fictício), com o objetivo de resgatar os últimos 30 anos de resistência da categoria, desde o momento em que Fernando Henrique Cardoso autorizou um Plano de Demissão Voluntária (PDV), logo após sua posse na Presidência da República, o que provocou graves consequências para a categoria, inclusive inúmeros casos de depressão e suicídio.
Luisinho ingressou no BB em janeiro de 1986, em Russas, no Ceará. Em 1988, foi trabalhar na cidade de Tabuleiro do Norte, no mesmo estado, onde compartilhava, com mais 28 funcionários, os trabalhos da agência.
Em julho de 1995, quando o BB lançou um PDV, o gerente da agência deveria definir quais funcionários seriam elegíveis para o programa. Havia duas opções para os empregados: aderir ao PDV ou ser transferido para outra agência, que não poderia ser no Ceará, mas em outras regiões do país. “Na região Nordeste, cortaram todas as vagas”, conta Luisinho. O objetivo do PDV era enxugar o quadro de pessoal. Naquele ano, o clima de terror foi tão grande que 13 mil funcionários aderiram ao programa.
“Foi quando chegou uma Carta Circular (documento normativo interno da época), à qual apenas o gerente tinha acesso.” Luisinho lembra que todos os 28 funcionários foram chamados e receberam a informação de que apenas sete permaneceriam na agência.
Uma vida de cabeça para baixo
“Tínhamos uma vida estabilizada, principalmente por ser no interior, e teríamos que viajar com a família para outro estado, em outras regiões do país. Quem não aderisse ao PDV seria demitido sumariamente.” A vida de Luisinho e de milhares de bancários sofreu uma reviravolta abrupta.
Em poucos dias, ocorreu uma profunda mudança na vida de Luisinho.
“Foi quando o gerente chegou e disse: você não vai ficar. Ou você adere ao PDV ou pede demissão. Eu tinha sete anos de banco. Então, pedi remoção. Entrei no sistema que indicava as agências e solicitei transferência para uma agência no Cruzeiro, em Brasília. Era agosto de 1995, uma quarta-feira. No dia seguinte, a transferência foi efetivada. No dia 6 de agosto, já estava em Brasília, assumindo meu novo posto de trabalho na agência. Minha família ficou no Ceará. O salário era de R$ 597, e o aluguel em Brasília girava em torno de R$ 500. Veja a situação. Tive que fazer horas extras. O banco concedeu uma ajuda de custo de R$ 1.000 por cinco meses.”
Foi um período em que o banco estava bastante sucateado. “Cheguei em Brasília, na agência do Cruzeiro, e os computadores eram muito arcaicos. Era evidente que havia uma política de desmonte do banco visando à sua privatização.”
A situação levou ao adoecimento da categoria.
Luisinho recorda seu amigo Chicão (nome fictício), que era assistente na agência de Tabuleiro do Norte. Ele decidiu aderir ao PDV e utilizou a indenização para abrir uma sapataria na cidade. “Um ano depois, o negócio quebrou.” Chicão ficou sem estrutura, desempregado e com o negócio falido. Isso o levou ao adoecimento: entrou em depressão e passou a ter problemas de saúde física. “Dois anos depois, fui visitá-lo. Ele não recebia ninguém; só me recebeu porque eu era padrinho de seu filho.” Luisinho relata que Chicão emagreceu de forma assustadora, além de ter sua saúde mental profundamente abalada. Relata ainda que “foram muitos os casos de suicídio entre a categoria no Ceará”.
Os bancários exilados
A imprensa da capital federal apelidou esses bancários de exilados. O Correio Braziliense publicou uma matéria afirmando que “éramos 600 exilados do BB. Guardei esse jornal”. A imensa maioria dos exilados era do Nordeste. Apenas na agência em que trabalhava, no Cruzeiro, sete eram nordestinos. Havia também muitos colegas de Minas Gerais.
Foram necessários alguns anos para estabilizar a nova vida, quando “me ligaram dizendo que havia vaga na agência de Tabuleiro, mas não retornei; permaneci em Brasília”.
Luisinho conta que é sindicalizado há 30 anos e vê, novamente, o BB retomar a política de demissões. “Essa política atual de classificação de ‘elegíveis’ é semelhante à dos anos 1990. Vejo muitos colegas da direção geral vivendo grande tensão. Há risco de perda de comissão e desestruturação familiar. É muito triste ver esse cenário se repetir 30 anos depois. O banco já havia superado o passivo trabalhista das seis horas e agora cria outro, inevitavelmente gerando novas ações judiciais.”
Luisinho avalia que a direção do BB sempre atacou e perseguiu os funcionários por meio de planos de gestão que mexem com a estrutura funcional e, indiretamente, com as famílias dos empregados. “Desde 1988, o BB criou vários planos para alterar a gestão de pessoal.”
O depoimento de quem enfrentou sucessivos ataques da direção do BB à categoria e à instituição evidencia a capacidade de resistência e luta dos bancários e do Sindicato. “É preciso muita resiliência diante de todas essas dificuldades.” Luisinho conta que se formou em Direito. No banco, começou como auxiliar, foi assistente administrativo, assistente, gerente de contas, assessor II e depois assessor I. “Permanente superação”, afirma.
Ao final da entrevista, ele destaca a importância do papel do Sindicato, resgatando a história desde sua chegada a Brasília. “O Sindicato nos acolheu e deu todo o apoio.” Na época, “o presidente era Jaques Pena, que esteve na agência e nos apoiou. A primeira coisa que fiz ao chegar a Brasília foi me sindicalizar. O Sindicato nunca deixou a categoria na mão. Por isso, sigo sindicalizado”.
Mas ninguém responsabiliza os “estrategistas de plantão”; eles nunca pagam as contas que deixam.
O Sindicato continuará essa batalha pelo respeito à jornada da categoria, mas, antes disso, exige respeito às pessoas e às suas vidas. A longa luta travada pela entidade representativa dos bancários enfrenta novamente ataques impostos pelas direções dos bancos públicos, sob o discurso de “enxugar” o quadro de pessoal, o mesmo utilizado por FHC na década de 1990.
Trata-se de uma política neoliberal permanente, que tenta impor ao BB as mesmas práticas dos bancos privados, para atender aos interesses de especuladores e financistas, em detrimento da função da instituição, que deve atuar para fomentar o desenvolvimento econômico nacional.
A defesa das conquistas da categoria e a luta por condições de trabalho que incorporem a tecnologia para melhorar o ambiente laboral, sem provocar adoecimento, estresse e perseguições, seguem centrais para evitar a divisão entre os funcionários.
O Sindicato não recuará em responsabilizar pessoalmente os dirigentes do banco que insistirem nesse processo pernicioso e maléfico.
Pedro César Batista
Colaboração para o Sindicato
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