Doutor Araguaia, memória e resistência

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O CineCultura Liberty Mall exibiu na última terça-feira (8) o documentário “Doutor Araguaia”. O filme, que estreou em Brasília, percorre as capitais, a contar a história do revolucionário João Carlos Haas Sobrinho, o médico da Guerrilha do Araguaia.

A vida do “Dr. Juca” é contada desde os tempos de estudante, quando presidiu o Centro Acadêmico do curso de Medicina, na Universidade Federal do Rio Grande do Sul, na cidade de São Leopoldo. Sua forte ligação com a luta estudantil o levou à prisão em 1964, já no início da ditadura liderada pelos militares, a mando dos EUA e com grande parte do empresariado brasileiro. O filme mostra o trabalho do médico junto à população da região de Porto Franco (TO), onde granjeou imensa admiração, e contém relatos das pessoas cuidadas por ele, carinho que persiste até hoje.

Além de militantes e familiares, de lideranças como Aldo Arantes, Renildo Calheiros, Jandira Feghali, Márcio Jerry, Vanessa Grazziotin e Perpétua Almeida, e da presidenta do PCdoB, a ministra Luciana Santos, a estreia pôde contar com a honrosa presença de uma vovó e sua família, presentes porque ela conhecera o Dr. João Carlos como sua paciente em Porto Franco, e, sabendo, veio prestigiar e falar à irma Sônia Haas de como o queria bem.

Após deixar Porto Franco, João Carlos vai ainda mais fundo no interior do Brasil, em Xambioá (PA). Atuaria como médico, dessa vez sem infraestrutura, salvando inúmeras vidas. Depois de assassinato em 1972, os militares desapareceram com seu corpo, não tendo sido localizado até hoje.

A Guerrilha do Araguaia, liderada pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), se organizou desde 1967, com a fixação de militantes já sob intensa perseguição nas cidades, para um trabalho político e para viverem com os camponeses da região do Bico do Papagaio. Quase uma centena de guerrilheiros, a maioria jovens, mas também o Constituinte e líder da bancada, Maurício Grabois, João Amazonas e Elza Moneratt e o operário Ângelo Arroyo, deslocaram-se de diversos pontos do país para a região.

Embora não tenham tomado a iniciativa do conflito, resistiram a três ofensivas do Exército, iniciadas a 12 de abril de 1972. O Exército só declara vitória em 1975, após mobilizar cerca de 25 mil soldados em três ofensivas, as duas primeiras repelidas pelos guerrilheiros. Só a partir de feroz violência sobre a população local, já na terceira expedição, foi possível a vitória dos militares, numa mostra da ligação da Guerrilha com o povo do Araguaia. Uma das razões foi precisamente a qualidade humana dos militantes para lá enviados. João Carlos, assim como Che Guevara, foi ao encontro de uma população sem nenhum médico, em Porto Franco e no Araguaia.

O filme relata uma vida das dezenas de guerrilheiros, que não desapareceram, mas foram desaparecidos – os quais precisam ser resgatados em memória e no direito do repouso eterno para as famílias ainda em busca da verdade.

Lançado em novembro do ano passado, Doutor Araguaia é dirigido por Edson Cabral e tem roteiro de Sônia Haas, irmã do médico assassinado pela ditadura e que há 50 anos o procura. É um sensível relato da luta das famílias para darem descanso aos seus mortos, cujas histórias a ditadura buscou apagar, em vão. Pela boca do povo reaparece o Dr. Juca, um herói brasileiro, um precursor do SUS, que ainda não pôde ser devidamente velado por familiares, camaradas e companheiros.

Na ocasião da estreia, o Sindicato dos Bancários de Brasília foi representado pelos diretores Rafael Guimarães e Paulo Vinícius da Silva, que distribuíram mais de 150 exemplares da revista Extratos, da entidade, com um dossiê sobre a ditadura de 1964 que versa sobre todas as formas de luta contra o regime, cujos crimes ainda seguem impunes – mas a luta por memória, verdade e justiça continua.

Da Redação