Artigo: A falência de uma sociedade

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Por Eustáquio Ribeiro

O Brasil caminha para o atingimento da triste e assustadora marca de 100 mil mortes em decorrência da Covid-19, e o mais espantoso quanto a isto decorre da aparente despreocupação da sociedade em geral com esta tragédia.

Esta despreocupação fica patente quanto se verifica o deslocamento desenfreado das pessoas, na ocupação de academias, mercados, bares, feiras e outros espaços de aglomeração, mesmo considerando que com toda a exposição sobre a pandemia, a maioria esmagadora já ouviu que a proximidade entre as pessoas é o fator preponderante para a transmissão do vírus.

Disto isto, é de assombrar esta despreocupação. O que será que ocorre com uma sociedade que perde a cada dia o equivalente a quatro aviões lotados, e, no entanto, até protesto contra governos para a abertura indiscriminada da atividade econômica fazem?

Pode se recorrer a explicações filosóficas e sociológicas para este tipo de comportamento, porém o que se ressalta é que a sociedade brasileira, com o auxílio fundamental de um governo federal que é a tragédia por si só, não consegue erigir um conjunto social digno de ser considerado um conjunto, partindo do conceito semântico de harmonia que deve presidir esta concepção.

Façamos, pois comparações com outras sociedades, especialmente da Europa, Coreia, Japão e China, países onde o governo central existiu (e existe) na coordenação dos esforços nacionais contra a pandemia. Mas, mais importante é notar a adesão da sociedade às medidas de isolamento determinadas pelos governos, o que contribuiu sobremaneira para que aqueles países passassem pelo pico da pandemia de uma forma bem mais rápida, e que vissem suas curvas de contaminação e, principalmente de mortes, caírem de forma rápida.

No geral aqueles países conseguiram circunscrever o vírus a determinados locais e seus picos duraram menos de um mês, ao passo que no Brasil, já caminhamos para a sétima semana com mortes diárias superiores a 1.000 pessoas.

É esclarecedor vermos imagens daqueles países com centros urbanos absolutamente vazios durante a fase mais rígida do confinamento, ao mesmo tempo que vemos no Brasil, mesmo quando da vigência de medidas mais restritivas, as regiões centrais das cidades absolutamente lotadas.

Pode se arguir que isto é uma questão cultural, e é mesmo. Porém, quando se observa uma sociedade que desdenha do mais primitivo instinto animal que nos acompanha nesta jornada que nos diferencia de todas as outras formas de vida do planeta, a sobrevivência, sendo tratada com desprezo, só se pode concluir que a sociedade brasileira está em processo acelerado de falência. Como sobreviver se sequer nos preocupamos com a própria sobrevivência e facilitamos o trabalho do coronavírus? Aliás, é importante ressaltar que esta decrepitude social já se arrasta há anos, e chegou ao cúmulo de eleger em 2018 uma aberração que é a antítese da vida e da sobrevivência.

*Antonio Eustáquio Ribeiro é dirigente da Fetec-CUT/CN, licenciado em Letras e mestrando em Políticas Púbicas