10º Congresso Distrital: Pandemia aprofunda atenção da categoria à saúde e às condições de trabalho dos bancários

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Em tempos de pandemia, a discussão sobre saúde e condições de trabalho é item prioritário da categoria para o próximo período. Neste sábado (31), durante a segunda mesa do 10° Congresso dos Bancários do DF e Entorno, as convidadas comentaram sobre a situação atual do trabalho bancário a partir da ótica da saúde e traçaram possibilidades para o cenário futuro. A empregada da Caixa Valéria Schultz, mestre em Governança, Tecnologia e Inovação (MGTI) pela Universidade Católica de Brasília (UCB), apresentou os resultados de seu trabalho sobre o direito à desconexão do trabalho.

O painel “Saúde e condições de trabalho decorrentes da reorganização produtiva do sistema financeiro” também contou com as contribuições da doutora em Psicologia Fernanda Duarte e da economista assessora técnica do Dieese Nádia Vieira. A mediação ficou a cargo das dirigentes da Federação dos Bancários do Centro Norte (Fetec-CUT/CN) Rafaella Gomes (que também é diretora do Sindicato) e Maria Gaia, empregadas da Caixa.

Responsável pela atuação do Grupo de Estudos em Práticas Clínicas, Trabalho e Saúde (Gepsat), o Laboratório de Psicodinâmica e a Clínica do Trabalho da UnB, lançado em fevereiro de 2018, a psicóloga Fernanda Duarte destacou que a categoria bancária enfrenta desde os anos 1980 os efeitos de diversas reestruturações. “A mudança para a jornada de 6h, a inclusão de novos tipos de serviços prestados e a inserção das tecnologias provam que reestruturação é a palavra do dia no sistema financeiro há décadas com influência sobre o adoecimento dos trabalhadores”, comentou Fernanda.

Sobre servidão voluntária e erosão do coletivo, a psicóloga afirmou que o problema está na permanência das noções de gestão da força de trabalho, fruto de um histórico colonialista de exploração do trabalho. Fernanda destacou que “sem pensar modernidade e colonialidade, não é possível entender a lógica do trabalho brasileiro. A tendência para o futuro é que haja a precarização do trabalho com trabalhadores convencidos de que os benefícios oferecidos pelos bancos fazem valer a pena todos os prejuízos à saúde mental”.

E por falar em precarização, a intensidade do trabalho bancário é mais um elemento nesta equação. De acordo com a economista Nádia Vieira, a redução de quase 83 mil postos de trabalho entre 2013 e 2020 impactam de maneira frontal na intensidade e distribuição da jornada de trabalho dos bancários.

“Houve um aumento significativo no número de clientes por trabalhador do ano de 2016 até o 1º trimestre de 2021. Só na Caixa, esse número aumentou mais de 103% por causa da pandemia, com o pagamento do auxílio emergencial. A pesquisa realizada pelo Sindicato, analisada pelo Dieese, revela que durante a pandemia a satisfação piorou, e tristeza, estresse, ansiedade e fadiga aumentaram, tornando a condição psicossocial do trabalhador muito ruim”, frisou a assessoria do Dieese.

No início da pandemia do novo coronavírus, “quase metade da categoria foi para o teletrabalho sem tempo para discussão sobre a mudança, lidando com a falta de estrutura para trabalhar, como mobiliário e demais equipamentos. Um ano depois, apesar dos avanços nas negociações entre bancários e banqueiros, o cenário ainda é parecido, sendo as metas de produtividade ainda mais excessivas”.

Existe vida fora do trabalho

Empregada da Caixa, Valéria Schultz tratou em sua tese de mestrado em Governança, Tecnologia e Inovação (MGTI), pela Universidade Católica de Brasília (UCB), sobre o direito à desconexão na categoria. Ao apresentar os dados da pesquisa, coletados por meio de questionário aplicado em 331 bancários de São Paulo e do DF, a mestra disse que a temática retoma a discussão de conceitos já superados, dos tempos da revolução industrial, quando muitos trabalhadores perderam a vida dentro dos locais de trabalho, tamanha a exploração. Alguns países do mundo já contam com dispositivos para garantir o direito ao não trabalho. No Brasil, o judiciário já tem decisões sobre o assunto e há o Projeto de Lei 4044, de 2020, de autoria do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que trata do assunto.

Com a pesquisa, realizada entre 6 e 26 de janeiro, foi possível destacar que, na pandemia, os bancários lidam com a autoexploração, o aumento do ritmo de trabalho e diminuição do descanso, estando a maioria em estado prolongado de vigília.

Na contramão do que está colocado, os bancários manifestam preferência pela regulamentação do direito à desconexão do trabalho na CLT. Para a empregada da Caixa, a conclusão da tese coloca que “a tecnologia como instrumento positivo para o trabalho é muito boa e não podemos abrir mão, mas temos que usar para melhorar a qualidade de vida e não o contrário, não podem ser ferramentas de escravidão moderna. Concordo com Émile-Auguste Chartier quando disse que ‘o trabalho é a melhor e a pior das coisas: a melhor, se for livre, e a pior, se for escrava’”.

Valéria finalizou sua participação afirmando veementemente que o números de horas conectadas não significa produtividade.

Joanna Alves
Do Seeb Brasília